alcateia #04, astrologia é real?
Você ainda pode achar tudo isso ridículo, mas pelos menos agora tem o pensamento crítico de achar errado pelos motivos reais, e não por seguir um senso comum superficial (e meio burro).
Filosoficamente, no momento que falamos sobre, ela se torna real: como tendência, debate, análises e estudos, astrologia é definitivamente real, mas não é sobre isso a conversa. Por mais que tenha afinidade ao tema, não quero argumentar como uma advogada de defesa. Minha ideia é apresentar um raciocínio crítico, além do senso comum, que possa gerar conversas ricas - e eu adoraria conversar com vocês sobre isso (me mandem email, compartilhem o que acharam etc etc).
Eu não consigo lembrar o que me atraiu para as estrelas (uau!), mas na quarta série eu já falava tanto sobre isso que ganhei, no amigo secreto da escola, um livro de capa dura com explicações detalhadas, embora simplistas, dos arquétipos dos signos. Ninguém da minha família ou da proximidade social gostava do assunto, não sei direito como fui introduzida. Como boa pessoa com influência profunda de Escorpião e Plutão (já criando polêmicas), eu sempre tive grandes obsessões por conhecimentos diversos, o que me trouxe uma coleção de curiosidades quase sempre inúteis.
(vocês sabiam que as hemácias são anucleadas? que nem todos os felinos rugem? que uma partícula alfa é igual a um núcleo de Hélio? que a Maria Antonieta e o marido não consumaram o casamento por 7 anos? que para o ácido hialurônico fazer efeito na pele precisa de moléculas de tamanhos diferentes para que haja penetração? que 3x+1 é um problema matemático impossível de resolver? que ficar de olhos abertos facilita aplicar delineador? etc etc)
De lá para cá foram longos períodos de estudos informais e dois anos de estudos formais, o que traz um pouco de respaldo de autoridade, sabe? Se bem que a ideia de que eu sou uma pessoa obcecada por pesquisar já sirva de credencial. Aviso: estou hiper ultra mega simplificando o básico dos conceitos. Mas bom, vamos lá: 5 coisas importantes para criar um pensamento crítico sobre astrologia.
1) Astrologia não é ciência. Não passou pela hipótese científica, não segue a lógica positivista, e ouso dizer que nem faria sentido ver dessa forma. A astrologia, para mim, é uma coleção de saberes e uma forma de analisar padrões, nada mais complexo que isso. Explicações que as pessoas dão e eu odeio: “Newton explicou a gravidade, é a força gravitacional das massas”, “nós somos feitos do mesmo material das estrelas” e “dá pra ver o seu DNA no mapa natal” (ah pronto).
2) Os astros não interferem na nossa vida. Por essas vocês não esperavam, né? A astrologia tropical traz uma relação de referencial entre o céu e a terra: astros não causam, eles indicam. Eu brinco que é só uma meteorologia, e minha analogia favorita é a do relógio: se tá marcando 8h, não quer dizer que o relógio cause que a gente esteja vivendo a oitava hora. Ele é só um indicador de algo que já está acontecendo, em uma convenção de signos (!!!!) para compreensão da informação.
3) As estrelas são apenas convenções. Elas foram transcritas em uma eclíptica da terra dividida uniformemente, ignorando os tamanhos reais das constelações, de forma que as correlações estrelares usam espaços geográficos regulares (também por isso é irrelevante que se descubram novas constelações ou planetas: o referencial é a eclíptica da Terra, não as constelações em si). Os astros foram escolhidos como convenção por serem confiáveis, por trazerem um parecer estatístico que justificasse a escolha. Mas cá entre nós: eles poderiam ter escolhido literalmente *qualquer* coisa que tivesse correlação com os acontecimentos, porque, de novo, a astrologia não causa nada, não cria nada, ela indica tendências.
4) Você não é seu signo. Até certo tempo, a astrologia era praticada por pequena parte das populações, e essas pessoas tinham acesso à hora de nascimento e portanto ao ascendente e todas as outras casas. Horóscopos, por exemplo, são feitos pensando nos ascendentes, nunca no signo solar. E existem tantas interações planetárias que em muitos mapas natais o signo solar (aquele do mês, que comumente chamamos de signo sem aposto) acaba representando uma parte irrisória. Tenho uma amiga leonina cujo ascendente em Touro, com suas devidas interações, é muito mais forte, e seria justo dizer que esse é o signo dominante. Planetas angulares, polaridade, tendências elementares e relações planetárias tornam o sol quase irrelevante, a não ser que ele apareça em dignidade ou em evidência (sim, isso é hiper ultra mega simplificado). Por isso também que tanta gente não se identifica com o próprio signo e outros fenômenos do tipo: é óbvio, a informação que comunicam é completamente errada.
5) Então como funciona essa bagaça? Astrologia é um saber antigo que se separou da Astronomia quando a Igreja Católica não queria que houvesse qualquer mensagem dos céus que fosse desligada de Deus com D maiúsculo. Até recentemente, precisava-se saber muito de matemática para trabalhar com astrologia, e mesmo agora faz diferença ter esse conhecimento para evoluir as relações planetárias e a construção esférica do mapa. Em suma, é um saber que foi estudado por anos com base estatística: milhares e milhares e milhares de dados organizados com probabilidade dos indicadores irem para um lado ou para outro. Simplificando e reiterando: funciona como um relógio um pouco diferente, em que os números são astros.
Pessoalmente, interpreto como uma ferramenta de aconselhamento, e julgo que essa fantasia de que pessoas que gostam do tema são cegas e tomam todas as decisão com base apenas nas estrelas é um estereótipo preconceituoso. Se partimos do princípio que crenças inexplicáveis pelo método positivista são coisas de gente burra, não estaremos falando só de astrologia. O mercado de investimentos se encaixa perfeitamente nesse conceito de estatísticas e análise de padrões, e ser aconselhado por investidor especialista nisso e por um astrólogo estudioso, para mim, é a mesma coisa. Tem um meme que eu sempre rio que diz: ué, você não acredita em astrologia, mas acredita no mercado financeiro que também não passa de uma convenção? (Sim, eu gosto de encher o saco dessa tropa que tem sido catalogada como finance bros & crypto bros).
Então assim, você ainda pode achar tudo isso ridículo, mas pelos menos agora tem o pensamento crítico de achar errado pelos motivos reais, e não por interpretações mal feitas. Ainda dá pra falar muita coisa dentro do tema: o viés de gênero relacionado ao preconceito, o revival recente da prática e o que isso significa para uma análise sociocultural do momento, o lado espiritual ligado ao ocultismo, mas isso fica (talvez) para outro dia. Ah, e segue aqui minha série de posts para Obvious desconstruindo estereótipos de signos e pincelando os arquétipos de forma menos superficial.
Um beijo e até a próxima (polêmica).